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A USUCAPIÃO POR ABANDONO DO LAR

                    Para compreendermos um pouco mais sobre o assunto, torna-se necessária a transcrição de uma breve definição de usucapião. Nas palavras de Flávio Tartuce[1], usucapião por ser definido como "uma situação de aquisição do domínio, ou mesmo de outro direito real (caso do usufruto ou da servidão), pela posse prolongada”.

                    Dentre as várias modalidades de usucapião, uma das mais desconhecidas, é a chamada usucapião por abandono de lar. O desconhecimento por parte da população sobre essa modalidade se deve ao fato de ter sido inserida em nosso ordenamento jurídico recentemente.

                    Sua inserção se deu através da lei nº 12.424/2011. Essa Modalidade está prevista no artigo 1.240-A, do Código Civil brasileiro. Vejamos:

Art. 1.240-A. Aquele que exercer, por 2 (dois) anos ininterruptamente e sem oposição, posse direta, com exclusividade, sobre imóvel urbano de até 250m² (duzentos e cinquenta metros quadrados) cuja propriedade divida com ex-cônjuge ou ex-companheiro que abandonou o lar, utilizando-o para sua moradia ou de sua família, adquirir-lhe-á o domínio integral, desde que não seja proprietário de outro imóvel urbano ou rural. 

§ 1o  O direito previsto no caput não será reconhecido ao mesmo possuidor mais de uma vez. 

                    Pode-se dizer que o objetivo desse tipo de usucapião é o benefício de um dos companheiros, sobre a totalidade do imóvel, em caso de abandono por parte do outro.

                    Como depreende-se da leitura do artigo acima transcrito, para que possa haver a usucapião por abandono, a posse deve ser exercida de maneira mansa e pacífica, por dois ano ininterruptos, devendo a propriedade pertencer aos dois cônjuges e  não exceder o limite de 250 m². A pessoa poderá adquirir a totalidade da propriedade através dessa modalidade apenas uma vez.

                    Embora o legislador tenha tentado ser objetivo no momento de elaboração do texto, tal artigo é motivo de muita controvérsia no mundo jurídico.

                   Entende-se que o legislador preocupou-se com a proteção do cônjuge abandonado, já que o entendimento é o de que esse determinado imóvel deve ser destinado à moradia, não podendo, portanto, qualquer imóvel ser objeto de tal usucapião. Logo, um imóvel comercial, por exemplo, não pode ser objeto de tal modalidade de usucapião.

                    Em relação ao tamanho do imóvel, podemos perceber que tentou-se delimitar o tamanho de maneira a não permitir que imóveis de altos valores fossem objeto de usucapião por abandono de lar, o que, logicamente, não deu muito certo, já que um imóvel de 250 m² pode custar, por exemplo, 100.000,00 (cem mil reais) em determinada região de uma cidade e mais 1.000.000,00 (um milhão de reais) em outra, o que mostra certa ineficácia da norma, no sentido de não aplicar tal modalidade a imóveis de altos valores.

                    Outro ponto de bastante controvérsia quando se fala em usucapião por abandono de lar, é modo como se deu esse abandono. Sobre tal assunto, vejamos o seguinte enunciado, aprovado na VII Jornada de Direito Civil:

“O requisito "abandono do lar" deve ser interpretado na ótica do instituto da usucapião familiar como abandono voluntário da posse do imóvel somado à ausência da tutela da família, não importando em averiguação da culpa pelo fim do casamento ou união estável. Revogado o Enunciado 499.” (Enunciado n. 595).

                    Logo, vê-se que nem sempre o abandono ensejará na possibilidade de perda do bem através da modalidade de usucapião em estudo, vez que o abandono por motivos alheios à vontade do companheiro não pode ser considerado para fins de usucapião em face de ex-companheiro.

                    Embora guarde semelhanças com usucapião especial urbano, a modalidade inserida pela lei nº 12.424/2011 tem suas especificidades e a que mais chama atenção é o período de posse que dá direito a usucapião, que é de dois anos.

                    A usucapião por abandono do lar tem como finalidade a proteção do instituto família e, embora seja motivo de muita controvérsia, podemos dizer que, através dessa modalidade, o legislador buscou amparar família abandonada por um dos companheiros, compensando, de certa forma, o desequilíbrio causado por esse abandono.

 

 

[1] TARTUCE, Flávio. Manual de direito civil: volume único. – Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: MÉTODO, 2017. p. 652.